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Muito se fala em Estado Democrático de
Direito, muito embora pouco de essencial se diga a respeito do que essa expressão signifique. Estado Democrático de Direito é aquele cuja atuação decorre da vontade do povo, consolidada por meio de um conjunto de regras universais e perenes previamente concebidas.
É num Estado Democrático de Direito que surge a importância do direito pré-concebido, justamente como mecanismo para frear paixões, rancores, preferências ou más intenções daqueles que momentaneamente ocupam o poder. A estabilidade de um regime depende do valor que se dá ao seu direito.
Num Estado Democrático de Direito é possível, sim, contestar a justiça ou a pertinência de uma lei. Quando isso ocorre, muda-se democraticamente a lei, exatamente como a anterior foi formulada. O que não se pode é deixar de aplicar uma regra em vigor simplesmente porque o sabor do momento assim prefere.
Dito isso, vamos aos fatos: a Constituição brasileira, em seu artigo 5º, LVII, diz que ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória. Está bem claro o dispositivo. Fala em trânsito em julgado, não em "julgamento de segunda instância".
Mas vamos a diante: o Código de Processo Penal, no mesmo sentido, diz no seu artigo 283, que a prisão decorre necessariamente de sentença condenatória transitada em julgado, ressalvadas exceções descritas no próprio artigo. Mais uma vez, fala-se em trânsito em julgado, não em julgamento após segunda instância.
O recente julgamento do STF quanto à prisão após julgamento em segunda instância, então, não traz nada de novo. Apenas dá aplicabilidade ao que está explícito e escancaradamente escrito na lei e na Constituição.
Inclusive, gente graúda, que hoje se diz escandalizada com a decisão do STF, já se beneficiou desse mesmíssimo entendimento. Em 2009, Luciano Hang foi condenado em segunda instância a 10 anos e 9 meses de reclusão por crime de lavagem de dinheiro e evasão de divisas. Sim, foi condenado pelo TRF4, pelo mesmo tribunal que condenou Lula. Está lá, no processo nº 2003.72.00.010174-2/SC.
Hang, no entanto, diferentemente de Lula, nunca chegou a ser preso. Foi beneficiado desde o começo pelo princípio da presunção de inocência, que hoje ele diz ser ruim para o Brasil. Ademais, diferente do processo de Lula, que tramitou mais rápido que a média, o recurso de Luciano Hang se arrastou por absurdos 7 anos no STJ, demora suficiente para que ocorresse a prescrição de suas penas e ele saísse impune. A mesma boia que agora salva Luís Inácio Lula da Silva da prisão já salvou antes Luciano Hang.
Não farei juízo de mérito quanto à justiça ou a pertinência dessa regra, esse eu deixo para os leitores, mas afirmo categoricamente: injusto mesmo é negar a uns o benefício que já se deu a outros em situação idêntica e sob a vigência da mesma lei. Isso, sim, é inconcebível num Estado Democrático de Direito